Parashat Metsorá

Voltando para casa

“Um rabino estava construindo uma Yeshivá (Centro de Estudos Judaicos) nos Estados Unidos. Ele contratou um arquiteto e explicou tudo o que seria necessário para a Yeshivá: dormitórios, salas de estudo, refeitório, etc. Quando chegaram à discussão sobre os acabamentos, o arquiteto perguntou:

– Rabino, para o acabamento existem duas opções. Podemos usar uma madeira comum, que tem um custo mais baixo, porém dura no máximo 90 anos até começar a se deteriorar, ou podemos utilizar uma madeira mais resistente, que é um pouco mais cara mas pode durar mais de 150 anos sem apodrecer. O que você prefere?

O rabino, após refletir um pouco, abriu um sorriso e respondeu:

– Meu querido, use a madeira comum. Não é por causa do preço, mas é porque não precisa durar tanto. Nós não pretendemos ficar fora de Israel por tanto tempo…”

Apesar de vivermos no exílio, rezamos três vezes por dia para que chegue rapidamente o momento em que voltaremos para nossa casa. Pois somente na Terra de Israel conseguiremos crescer e florescer espiritualmente com todo o nosso potencial.

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Na Parashá da semana passada, Tazria, a Torá nos ensinou sobre a Tzaráat, a doença espiritual que atacava as pessoas que haviam cometido certas transgressões, entre elas o Lashon Hará (denegrir ou caluniar o próximo), e descreveu sobre sua manifestação física através de manchas na pele e nas roupas do transgressor. E a Parashá desta semana, Metzorá, começa descrevendo o processo de cura para aqueles que estavam contaminados com a Tzaráat. Na sequência a Parashá fala sobre mais uma forma de manifestação física da Tzaráat, através de manchas que surgiam nas paredes da casa do transgressor.

Porém, a ordem segundo a qual a Torá trouxe os ensinamentos sobre a Tzaráat desperta uma dúvida. Por que primeiro a Torá ensinou sobre a contaminação na pele e nas roupas, interrompeu com a explicação da cura, e somente depois falou sobre a Tzaráat nas paredes? Por acaso existe na Tzaráat das paredes algo diferente da Tzaráat da pele e das roupas?

A resposta está em um interessante ensinamento do Talmud (Negaim 12:4), que afirma que a contaminação da Tzaráat nas paredes ocorria apenas nas casas localizadas na Terra de Israel, diferente da Tzaráat que atingia a pele e as roupas, que contaminava as pessoas independentemente de onde estivessem. Mas qual o motivo desta diferença? Se a Tzaráat era uma punição pela transgressão do Lashon Hará, qual a diferença se a casa estava em Israel ou na Diáspora?

Para entender, antes de tudo precisamos saber que não foi por acaso que D’us decretou a Tzaráat como punição pela transgressão de Lashon Hará. Ele também não foi arbitrário ao fazer com que a Tzaráat atingisse apenas a pele, as roupas e as paredes das casas. D’us poderia ter feito com que a Tzaráat também atingisse os utensílios de prata, os livros e os animais, mas Ele não fez. Portanto, deve haver alguma relação forte entre o Lashon Hará e a Tzaráat que atinge especificamente o corpo, as roupas e as paredes de casa.

D’us nos pune “Midá Kenegued Midá” (medida por medida), isto é, da maneira que transgredimos, assim também é a forma como somos castigados. Da mesma maneira que o Lashon Hará invadiu a intimidade da vítima e a expôs a uma humilhação pública, assim também a Tzaráat na pele invade a intimidade do transgressor e o força a uma humilhação pública. As roupas nos vestem e nos dão dignidade. Da mesma forma que o Lashon Hará invadiu a dignidade da vítima, assim também o transgressor perde suas roupas e a sua dignidade através da Tzaráat nas roupas. E finalmente, por causa do Lashon Hará a vítima perde até mesmo o conforto e a privacidade em sua própria casa, pois ela não se sente mais tão segura e relaxada nem mesmo dentro do seu próprio lar, passando a viver suspeitando o tempo inteiro de que podem estar falando mal dela. Em muitos casos a vítima precisa até mesmo sair da sua casa e mudar-se para outro lugar por causa da vergonha que o Lashon Hará causou a ela. Da mesma maneira, a Tzaráat nas paredes de casa obrigava o transgressor a abandonar o conforto e a privacidade de sua casa.

Porém, explica o Rav Yaacov Weinberg (EUA, 1923 – 1999) que somente o que é realmente nosso para sempre é atingido pela Tzaráat. Nós somos donos do nosso próprio corpo e somos donos das nossas próprias roupas. Porém, não somos donos de nenhuma construção feita fora da Terra de Israel, pois quando estamos na Diáspora, não estamos no nosso local verdadeiro e definitivo. A pessoa quando volta para casa pode levar seu corpo e suas roupas, mas não a sua casa. Por isso, por mais que possamos ser proprietários temporários de construções fora de Israel, não temos a posse verdadeira, pois quando voltarmos para casa, não poderemos levá-las conosco.

Isto explica a diferença da Tzaráat das paredes, que não atingia as casas que estavam fora de Israel. Se o Lashon Hará tirou a dignidade e a privacidade, que são coisas que realmente pertencem à vítima, então a punição vinha na mesma moeda, através da Tzaráat na pele e nas roupas. Mas quando alguém perde o conforto de sua casa fora de Israel, esta não é uma perda real, pois não era verdadeiramente sua casa definitiva, era apenas algo temporário. Como o transgressor não havia causado uma perda real, então ele também não era castigado com a obrigação de sair da sua casa.

Aprendemos desta Parashá um fundamento importante: temos uma conexão espiritual muito forte com a terra de Israel, a ponto de ser o único lugar onde um judeu verdadeiramente adquire uma terra. Este deveria ser o nosso sentimento em relação à nossa vida na terra de Israel. Porém, infelizmente, estamos muito longe desta realidade. A grande maioria dos judeus que vive na Diáspora não considera suas casas como sendo apenas temporárias, e poucos são os que abandonariam o conforto do exílio para voltar para Israel. Isto não é algo novo, podemos aprender com a nossa história. Em Pessach, comemoramos a saída do povo judeu do Egito. Mas não foi o povo inteiro que saiu, foi apenas 20% do povo, enquanto a grande maioria decidiu ficar. Apesar de serem escravos, apesar das dificuldades que passavam no Egito, o comodismo venceu.

Uma das primeiras perguntas que nos farão quando chegarmos ao nosso Julgamento Celestial será: “Você esperou todos os dias pela redenção?”. O que significa “esperar todos os dias”? Quando alguém faz uma entrevista de emprego e está esperando uma resposta, cada dia de espera parece uma eternidade, e cada vez que o telefone toca, o coração dispara. Assim devemos esperar, ansiosamente, pelo Mashiach e pela nossa volta para casa.

Um dos maiores sinais de desconexão espiritual de um judeu é quando ele deixa de sentir a amargura do exílio e perde a vontade de voltar para casa. Estamos há mais de dois mil anos no exílio, cumprindo a profecia de que o povo judeu seria espalhado pelos quatro cantos do mundo e viveria entre todas as nações. Mas mesmo assim nós não perdemos a esperança de voltar para a nossa terra depois da vinda do Mashiach. Rezamos todos os dias pela nossa redenção, com a certeza de que, o mais breve possível, definitivamente voltaremos para nosso verdadeiro lugar, para a nossa casa.
 

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